Carta de Virginia Cimminelli às autoridades de Paracatu

 

Ao Poder Público de Paracatu

Ref. Esclarecimentos diante das séries de reportagens veiculadas na imprensa

Prezados Senhores,

Como coordenadora do projeto de pesquisa “Avaliação do impacto ambiental e à saúde humana decorrente da ocorrência de arsênio na região da Mina Morro do Ouro, Paracatu, Minas Gerais, Brasil”, venho reafirmar, com veemência, os resultados obtidos pelo nosso grupo, os quais contradizem as notícias que vem sendo veiculadas na imprensa sobre os riscos à saúde humana para a população de Paracatu.

O projeto, iniciado em 2010, tem como objetivo fornecer à Kinross Brasil Mineração (KBM) os dados científicos necessários para oferecer respostas fundamentadas a quaisquer perguntas relacionadas à potencial disponibilidade e mobilidade do arsênio, tanto de origem natural (background) quanto antropogênica, em Paracatu. A abordagem para a avaliação de risco à saúde humana baseou-se na determinação da exposição da população, considerando-se as principais rotas de exposição, tais como arsênio (As) ingerido (água + alimentos + poeira do solo) e inalado (poeira). A exposição ao arsênio medida foi comparada à dose de referência BMDL0.5 (BMDL- benchmark dose limit) , estabelecida pelo Comitê Especialista em Aditivos Alimentares da Organização Mundial da Saúde (WHO) e Organização para Alimentação e Agricultura (FAO) (JECFA).

Para calcular o arsênio ingerido e inalado, a pesquisa focalizou a cidade de Paracatu na proximidade da mina Morro do Ouro. Amostras de água de superfície de abastecimento da cidade (COPASA) e de águas de poços utilizados pela população, foram analisadas bem
como filtros de amostradores de poeira atmosférica (particulados totais – TSP e abaixo de 10 micrometros – PM10) e de amostras de poeira sedimentável coletadas em áreas residenciais/comerciais. Essas últimas foram submetidas aos ensaios de bioacessibilidade – BAC (refere se à fração solúvel no trato gastrointestinal e, portanto, disponível para absorção). Uma pesquisa em itens alimentares comumente consumidos, adquiridos nos supermercados e feiras locais, foi também conduzida.

A principal conclusão da investigação é de que exposição ou ingestão total de arsênio, considerando-se todas as fontes, foi de cerca de 15% do valor da dose de referência (BMDL0.5) de 3 μg/kg/dia e, portanto, pode considerada baixa. Os resultados da pesquisa, cujas conclusões gerais foram confirmadas pelo trabalho realizado pelo CETEM, foram apresentados e discutidos com a comunidade científica no Evento, Arsenic 2014, realizado na Argentina (1). O evento reúne os maiores especialistas em pesquisa em arsênio de diversas partes do mundo. Outras publicações internacionais com os dados obtidos encontram-se em fase de preparação e submissão.

Sendo assim, a presente correspondência tem como objetivo tentar esclarecer e tranquilizar a população da cidade e seus representantes, que vem sendo expostos a dados ora distorcidos ora fora do contexto, através da mídia local e nacional. Essas notícias ignoram as conclusões dos estudos detalhados coordenados pela UFMG e pelo CETEM, que indicaram baixo risco de exposição, bem como o fato de que os estudos epidemiológicos não demonstraram qualquer evidência de índice anormal de patologias da cidade em relação ao Estado de Minas Gerais ou ao país.

Finalizando, agradeço a atenção e coloco-me à disposição para eventuais esclarecimentos que se façam necessários, da forma presencial ou outra, sobre os resultados das nossas pesquisas.

Atenciosamente,

Virginia S.T. Ciminelli
Professora Titular
Depto. Engenharia Metalúrgica e de Materiais
Universidade Federal de Minas Gerais